Há poucas semanas, o Papa Francisco começou o seu tempo de férias que, como tem sido seu hábito, não vai implicar uma saída do Vaticano, permanecendo na sua residência, a casa de Santa Marta. Ficam suspensas as suas atividades normais, como as audiências e missas públicas, mas o seu ritmo diário não sofre grandes alterações. Da parte de pessoas próximas ao Santo Padre, explica-se o que muda nestes tempos: “Muda, pelo contrário, e muito, o tempo que o Papa Francisco dedica à oração, ao estudo, à leitura, a ouvir música, bem como aos temas próprios do seu cargo”.
Aprendamos um pouco deste exemplo para vivermos as nossas férias. Longe dos nossos ritmos habituais, poderemos ter tempo para nos dedicarmos àquilo que, ao longo do ano, nos vamos queixando de não poder fazer devido às nossas ocupações: tempo para rezar, tempo para nos cultivarmos, tempo para a leitura e a arte.
Mas saliento um ponto: “os temas próprios do seu cargo”. A pergunta vai direta ao essencial: Quais são os temas próprios do meu cargo, de quem sou? Fora do trabalho somos pais, mães, filhos, avós, cristãos, amigos... Ocuparmo-nos em sermos mais o que nos define como pessoas na nossa relação com Deus e uns com os outros. Um tempo de qualidade espiritual e humana é tão ou mais importante que o tempo para dormir ou não fazer nada. É um tempo que nos recria e nos ajuda a sentirmo-nos inteiros no que somos mais profundamente.
Com estes desejos, o Secretariado Nacional do Apostolado da Oração deseja a todos os que nos acompanham através das nossas publicações, site, redes sociais, no Passo-a-Rezar ou no Click To Pray, umas ótimas férias!
Inácio de Loiola, fundador da Companhia de Jesus, é o homem do “mais”, da maior glória de Deus, do maior serviço das almas, do bem mais universal, um homem apaixonado por Cristo, com grande amor e espírito de obediência à Igreja, com desejos grandes de fazer tudo para ajudar os outros. Pai e fundador, deixou grandes e maravilhosos textos, milhares de cartas, o pequeno/grande livro dos Exercícios Espirituais. Apóstolo de Roma, primeiro Superior Geral da Companhia de Jesus, tinha um coração universal cheio de fogo evangelizador. Homem do discernimento espiritual, conselheiro sábio e prudente, fundador determinado pela vontade de Deus.
Hoje, em mais de uma centena de países, em muitos serviços e ministérios, inseridos em múltiplos trabalhos, os seus seguidores, os jesuítas, procuram imitar o seu fundador, mestre e pai. Desde professores universitários, a apóstolos dos sem-abrigo, desde dedicados a dar os Exercícios Espirituais a capelães de hospitais e cadeias, desde confessores e diretores espirituais a trabalhadores dedicados com os refugiados, desde professores e mestres em colégios até párocos em diversas dioceses, desde homens da arte, da ciência, da cultura, a missionários pobres e perseguidos na China e em tantos outros países, todos unidos pelo mesmo ideal, seguindo as Constituições escritas por Inácio, buscando na oração a força e a graça de evangelizar como companheiros de Jesus, cerca de dezassete mil jesuítas espalhados pelo mundo procuram, apesar de frágeis e pecadores, ser instrumentos do Reino, servidores do mundo, na Igreja e com a Igreja.
Dia 31 de julho, aniversário da morte de Inácio de Loiola, em 1556, vamos celebrar a sua festa litúrgica e recordar sua vida e sua obra, sua oblação e seu serviço, sua paixão por Cristo e seu ideal de peregrino, seu encanto pelas missões e seu serviço dos pobres. E, olhando o mundo à nossa volta, descobriremos, agradecidos, tantos seguidores de Inácio, tantos leigos que seguem seu exemplo de vida evangélica, tantos e tantos que fazem anualmente a experiência dos Exercícios Espirituais, tempo forte de oração que liberta e que ajuda a ordenar a vida, e depois vivem com encanto e alegria a espiritualidade inaciana. Centenas de leigos a viverem a sua participação em grupos de Comunidades de Vida Cristã (CVX), muitas dezenas a organizar campos de férias e a ocupar-se dos mais jovens e dos mais pobres, dezenas a colaborar nas revistas da Companhia de Jesus em Portugal, nas paróquias que os jesuítas levam por diante, nas obras apostólicas, como o Apostolado de Oração, na colaboração dedicada em Casas de Exercícios, em Colégios, na Faculdade de Filosofia em Braga, em quatro Centros Universitários, etc., etc. Inácio continua vivo, no mundo à nossa volta, na vida de muitos jesuítas e de centenas e centenas de leigos que colaboram com eles, em muitas e variadas obras.
Ainda durante a vida de Inácio se deu início em Portugal à fundação da primeira Província da Ordem religiosa por ele fundada e se começaram grandes empreendimentos como o Colégio das Artes, em Coimbra, hoje edifício pertencente à Universidade. Sob a orientação de Inácio de Loiola partiram de Portugal muitos missionários, como Francisco Xavier, quer para o Brasil quer para a África e o Oriente, tendo chegado à Índia, ao Japão, à China. Pelo mundo além, em muitos países, há marcas culturais e evangelizadoras dos jesuítas portugueses, missionários de muita audácia e de grande dedicação. Quem visita a Madeira ou os Açores pode visitar os edifícios dos Colégios e das Igrejas fundadas pelos jesuítas portugueses. E o mesmo se pode afirmar de muitas cidades do Brasil, de Angola, Moçambique, Macau, Timor, Goa, etc. A Província portuguesa que Inácio fundou foi uma Província de mártires, de jesuítas, padres, irmãos e estudantes que derramaram seu sangue por Cristo, como o grande São João de Brito nos matos do Maduré, na Índia, ou o grupo dos que se reuniram no Vale do Rosal, na Charneca da Caparica, que partiram rumo ao Brasil e foram martirizados junto das Canárias.
Em muitas partes do mundo, Inácio de Loiola e o seu carisma continuam vivos, graças ao esforço, ao sangue derramado, à dedicação de muitos jesuítas na Índia, na China, na Síria, nalguns países africanos, na América Latina, donde nos veio o Papa Francisco. Muitas odisseias de amor, de vida doada até ao fim, de dedicação e de serviço, com o desejo da maior glória de Deus e do bem mais universal.
“A profundidade está escondida. Onde? Na superfície”. (Von Hofmannstahl)
O livro de Rute ocupa algumas páginas – poucas, apenas quatro capítulos que se leem calmamente numa hora – na parte do Antigo Testamento a que os hebreus chamam de “Escritos”: a par da “Lei” (os cinco livros do Pentateuco) e dos “Profetas”, os “Escritos” apresentam-nos a experiência de fé no quotidiano, por entre os passos e passagens, encontros e desencontros da nossa própria vida. Porque a Bíblia não narra apenas eventos extraordinários ou grandes acontecimentos salvíficos: também na história de uma migrante se revela a presença de Deus.
Elimelec é um chefe de família hebreu, pai de dois filhos, que, devido a uma situação de fome e carestia em Israel, se vê forçado a emigrar de Belém de Judá para um país vizinho chamado Moab. Aí se estabeleceu; e, a julgar pelo silêncio do texto, podemos depreender que Elimelec se estabeleceu sem dificuldades de maior, conseguindo superar a situação de carestia.
Mas, num espaço de dez anos, morrem na família quer o patriarca Elimelec, quer os seus dois filhos, que entretanto haviam casado com duas jovens de Moab chamadas Rute e Orfa. Noemi, viúva de Elimelec, decide então regressar à sua terra natal para encontrar junto da família afastada algum apoio: salvo raras exceções, a mulher dependia – em Israel como, regra geral, em toda a antiguidade – da proteção económica e social do marido e dos filhos; por isso, perder quer o marido, quer os filhos significava, por outras palavras, cair numa situação de máxima fragilidade e vulnerabilidade. O livro de Rute apresenta-nos a história de uma presença e ação de Deus manifestadas, não na força e no poder dos grandes sinais, mas no silêncio e vulnerabilidade de duas viúvas.
Duas viúvas porque Rute decide ficar com a sua sogra Noemi, ao passo que Orfa regressa à sua família de origem. Rute acompanha Noemi no regresso a Israel: o que Rute diz a Noemi reveste-se de uma rara qualidade:
«Rute respondeu: “Não insistas para que te deixe, pois onde tu fores, eu irei contigo e onde pernoitares, aí ficarei; o teu povo será o meu povo e o teu Deus será o meu Deus. Onde morreres, também eu quero morrer e ali serei sepultada. Que o Senhor me trate com rigor e ainda o acrescente, se até mesmo a morte me separar de ti”» (Rt 1, 16-22).
Nas palavras de Rute – uma estrangeira para Israel – encontramos a definição por excelência da aliança de Deus com Israel: uma aliança de pertença mútua e de fidelidade até à morte. Para o texto, a aliança de Deus revela-se na fidelidade de uma estrangeira a uma viúva de Israel: algo que, segundo as leis de Israel, Rute não tinha obrigação de fazer.
Noemi e Rute chegam a Belém, e Rute começa a respigar nos campos durante a ceifa da cevada. Trata-se de uma das tradições mais veneráveis em Israel: os agricultores, segundo a lei, só podiam ceifar uma vez os campos; o que daí sobrasse seria deixado nos campos para que os pobres e migrantes – despossuídos de propriedades e rendimentos – pudessem respigar e recolher a sua parte. A propriedade em Israel é privada, mas não é fechada: tem um espaço de respiro que lhe permite, em parte, libertar-se do egoísmo absoluto.
A história termina bem: Rute casa-se com um parente afastado de Elimelec chamado Booz, garantindo assim proteção para si e para Noemi. O diálogo de Booz com Rute é também de uma beleza única: «Já me contaram tudo o que fizeste pela tua sogra, depois da morte do teu marido: como deixaste o teu pai, a tua mãe e a terra onde nasceste e vieste para um povo que há bem pouco nem conhecias. O Senhor te pague por todo o bem que fizeste; que o Senhor, Deus de Israel, sob cujas asas te acolheste, te dê a recompensa merecida» (Rt 2, 11-12).
Conclui o texto referindo que Rute terá um filho de nome Obed, que será o avô de David, o grande rei de Israel. Rute, a estrangeira, entra assim na genealogia que dará origem ao Messias de Israel: sim, o Messias será um mestiço, não um sangue-puro. Mateus recolherá este dado, ao colocar o nome de Rute na genealogia de Jesus (Mt 1, 5).
Precisamos urgentemente de histórias que nos recordem aquilo que somos. Vivemos tempos difíceis, onde emerge – de modo lento mas inexorável – uma mentalidade segundo a qual o estrangeiro representa uma ameaça à nossa segurança, aos nossos empregos (uma bem maior ameaça ao emprego e à coesão social advém da fuga de capitais para paraísos fiscais, por exemplo), à nossa cultura e modo de vida. O livro de Rute aponta uma flecha no coração da história bíblica e da nossa própria história, falando-nos de migração. E recorda-nos como tudo começou, quando Deus pediu a Abraão para sair da sua terra, rumo a uma terra que não era a sua… (cf. Gn 12, 1-4).
(imagem: Rute e Noemi, vitral da Igreja de Saint James em Halifax, Canadá).
Perante o presente assédio ideológico do Ministério da Educação ao serviço público de educação prestado por escolas/colégios com contrato de associação, ocorre-me fazer algumas breves observações.
Assim afirma o artigo 43.º da Constituição da República Portuguesa: «É garantida a liberdade de aprender e ensinar». «O Estado não pode programar a educação e a cultura segundo quaisquer diretrizes filosóficas, estéticas, políticas, ideológicas ou religiosas». Portanto, a lei fundamental do nosso País proíbe que o Estado se arvore em educador do povo, como acontece em países governados por ditaduras de esquerda ou de direita.
O direito, e consequente dever, de educar pertence aos pais, como recorda o artigo 26.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem: «Aos pais pertence a prioridade do direito de escolher o género de educação a dar aos filhos». Na mesma linha, afirma o n.º 3 do artigo 14.º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia: «São respeitados (...) o direito dos pais de assegurarem a educação e o ensino dos filhos de acordo com as suas convicções religiosas, filosóficas e pedagógicas». Ao direito dos pais escolherem o tipo de educação que querem para [os] seus filhos corresponde o dever do Estado de respeitar e viabilizar na prática tal direito.
Dir-se-á que em Portugal se cumpre à risca este direito dos pais escolherem o tipo de educação que desejam dar aos seus filhos. Alexandra Leitão, Secretária de Estado, que confessou ser a autora ideológica da norma que corta os contratos de associação, confessou também que escolheu, «por acaso» (há acasos absolutamente intencionais), pôr os seus filhos no Colégio Alemão, em Lisboa, escola particular fora da rede pública de educação, onde os pais devem pagar elevadas propinas. Um justo exercício de liberdade, mas que não é uma carta de recomendação da qualidade das escolas estatais.
Simplesmente importa notar que o exercício deste direito fica bem caro aos pais. É o livre exercício de um direito reservado aos ricos, ou dito mais diplomaticamente, aos que têm uma boa base financeira. Negar o mesmo direito aos de escassos recursos, ou dizendo o mesmo menos diplomaticamente, aos pobres, é uma injustiça que brada aos céus. A liberdade não é um direito que se compra, mas é um dever concedê-la a todos, sem qualquer distinção.
Quão longe estamos em Portugal de os pais poderem, na prática, exercitar o direito constitucional de escolherem o tipo de educação que desejam proporcionar aos filhos! O serviço público de ensino proporcionado por escolas/colégios particulares com contrato de associação é uma feliz pequena ilha (menos de 0,3%) de liberdade real, no mar de estatização do ensino ou da opção de ir para as alternativas caras do ensino particular, para quem tem capacidade financeira de o fazer. É esta pequena ilha de liberdade real que o Ministério da Educação decidiu cortar substancialmente, de modo desajeitado e prepotente, negando-se ao diálogo e rasgando os contratos assinados um ano antes com a duração de três anos. Em todo o lado custa deparar-nos com a falta de educação, mas muito mais quando se trata da casa onde deveria habitar como sua residência oficial.
Nos tempos da velha senhora, a tentação de estatizar o ensino era igual ou ainda maior. Mas tratou-se de uma quarentena de anos de ditadura do velho Estado novo, com pensamento absolutista e cartilha única. Vivemos felizmente em democracia, que não pode ficar encaixilhada no nome e congelada em palavras ocas, mas que tem de descer às realidades concretas, especialmente no campo da educação. Se é intolerável o estatismo de direita, controlador e despótico, não o é menos o estatismo de esquerda. O estado e o governo são para as pessoas e não as pessoas para o estado e o governo.
Importa democratizar a democracia. Urge libertar a liberdade também no campo da educação. Há que libertar o direito, ainda cativo, de os pais poderem, na prática, escolher a educação que querem proporcionar aos seus filhos.